sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Pen Clube Português e Associação Portuguesa de Escritores premeiam 8 escritores portugueses no mesmo dia

Ontem foi um dia algo insólito. Primeiro são anunciados os prémios do Pen Clube Português e deparamo-nos com o feito de os jurados não terem conseguido tomar decisões e concederem prémios ex-aequo em 3 das 4 categorias. Pergunto eu: isto faz algum sentido? Sim, em algumas situações podemos aceitar que haja obras de qualidade equivalente e que os jurados não consigam decidir, mas que isso aconteça em 3 categorias?! Parece-me só falta de critério.

E depois da torrente de vencedores dos Prémios do Pen Clube Português eis que a Associação Portuguesa de Escritores (APE) decide, no mesmo dia, anunciar o Grande Prémio do Romance e Novela. Mas que sentido faz anunciar os vencedores de 2 prémios literários de prestígio no mesmo dia? É uma questão de competição? Ou é um simples desconhecimento dos princípios básicos de marketing e comunicação? Quem fica prejudicado no meio disto tudo são os escritores que ficam algures perdidos numa lista e enorme de vencedores e têm menos projecção mediática. É caso para dizer que difícil ontem foi ser escritor em Portugal e não receber um prémio!

Vamos então conhecer as obras que para o Pen Clube Português e a APE representam o melhor da literatura produzida em Portugal em 2013:


“Que Importa a Fúria do Mar” de Ana Margarida de Carvalho, Teorema (Grande Prémio de Romance e Novela APE-DGLAB 2013)


Sinopse
Frente a frente, duas gerações de um Portugal onde, às vezes, parece que pouco mudou…
Numa madrugada de 1934, um maço de cartas é lançado de um comboio em andamento por um homem que deixou uma história de amor interrompida e leva uma estilha cravada no coração. Na carruagem, além de Joaquim, viajam os revoltosos do golpe da Marinha Grande, feitos prisioneiros pela Polícia de Salazar, que cumprem a primeira etapa de uma viagem com destino a Cabo Verde, onde inaugurarão o campo de concentração do Tarrafal.

Dessas cartas e da mulher a quem se dirigiam ouvirá falar muitos anos mais tarde Eugénia, a jornalista encarregada de entrevistar um dos últimos sobreviventes desse inferno africano e cuja vida, depois do primeiro encontro com Joaquim, nunca mais será a mesma.

Separados pelo tempo, pelo espaço, pelos continentes, pela malária e pelo arame farpado, os destinos de Joaquim e Eugénia tocar-se-ão, apesar de tudo, no pêlo de um gato sem nome que ambos afagam e na estranha cumplicidade com que partilham memórias insólitas, infâncias sombrias e amores decididamente impossíveis.

"Que Importa a Fúria do Mar" é um romance de estreia com uma maturidade literária invulgar que coloca, frente a frente, duas gerações de um Portugal onde, às vezes, parece que pouco mudou.



“Como Uma Flor de Plástico na Montra de um Talho” de Golgona Anghel, Assírio & Alvim (Prémio Pen Poesia 2013)


Excerto
"Subiu dez andares para assim nos poder olhar de frente. Não lhe interessa o que dizem os dissidentes da ditadura. Mas confessa que gostava dos chocolates Toblerone que a sua tia lhe trazia no Natal. Colecciona cabelos nas folhas de um herbário sentimental. Escreve a palavra vazio depois da palavra espera. É como a Salomé — dizem — pede cabeças mas só lhe entregam pizzas. Perdeu a fé num ataque de riso. Exige agora silêncio e um copo de tinto, enquanto apresenta em directo a autópsia da sua glória."



“Fogo” de Gastão Cruz, Assírio & Alvim (Prémio Pen Poesia 2013)


Excerto
TW, Dragon Country

Acreditávamos no tempo quando
o país do dragão era um espectáculo
de fronteira inviolável, e a angústia
não saía de dentro do cenário, e a
emoção era um lugar fictício:
acreditar no
tempo o erro mais terrível



“Para Que Serve a História?” de Diogo Ramada Curto, Tinta-da-China (Prémio Pen Ensaio 2013)


Sinopse
«Papá, para que serve a história?» — com esta simples pergunta, Bloch abria um dos mais belos livros de história de todos os tempos, «Apologie pour l’histoire ou Métier d’historien». Colocada com a ingenuidade dramática de uma criança, a questão merece uma série de respostas subtis, que também Diogo Ramada Curto procura fornecer: a curiosidade por todo o tipo de actividades humanas; a vontade de conhecer a sociedade no seu todo e nos seus tempos múltiplos; sobretudo, o desejo de compreender a vida real, no seu quotidiano e nas suas práticas mais repetitivas, por oposição a uma concepção morta do passado, enterrado em museus, monumentos e manuais.

Mais importante ainda, o estudo da história faz parte das necessidades de formação de cidadãos politicamente conscientes, capazes de se baterem pelos seus ideais democráticos. Afinal de contas, como salientava Bloch, o regime nazi pôs a descoberto a irresponsabilidade de muitos intelectuais. A sua passividade e até o seu colaboracionismo frente a um regime feroz — fundado em interpretações históricas míticas ou totalmente falaciosas — traduziram-se numa incapacidade gritante para se dedicarem ao estudo da história e para se libertarem do peso do passado.

«Para Que Serve a História?» relança este debate cívico e intelectual e ao mesmo tempo questiona os vícios e a pobreza que, segundo o autor, imperam hoje nas universidades portuguesas.



“Ara” de Ana Luísa Amaral, Sextante (Prémio Pen Narrativa 2013)

 
Sinopse
"Primeiro: a prosternação diante do altar. A hesitação diante da proliferação dos ritos: sacrifício, louvor, cântico, narrativa. Figuras e vozes, acólitos. Insurgências. Japoneiras e túneis do sentido. Discrepância a todas as vozes acumulando num sentido. Não único, mas unívoco. Desde a infância.

Segundo (como se diz de um andamento ou de um painel): o tríptico dentro do tríptico das DUAS IRMÃS: a narrativa oblatória e clara da paixão sáfica. Ardente e casta. Sem falso pudor. Vergonha é não te amar. A oferenda lírica.

Terceiro: não é coisa de rasgar como romance este romance. Assente na pedra do lar um prisma multifacetado e translúcido: o amor único, a palavra. A brisa do arado sobre a ara." 
Por Maria Velho da Costa



“As Primeira Coisas” de Bruno Vieira Amaral, Quetzal (Prémio Pen Narrativa 2013) 



Sinopse
Quem matou Joãozinho Treme-Treme no terreno perto do depósito da água? O que aconteceu à virginal Vera, desaparecida de casa dos pais a dois meses de completar os dezasseis anos? Quem foi o homem que, a exemplo do velho Abel, encontrou a paz sob o céu pacífico de Port of Spain? Porque é que os habitantes do Bairro Amélia nunca esquecerão o Carnaval de 1989? Quem é que poderá saber o nome das três crianças mortas por asfixia no interior de uma arca? Onde teria chegado Beto com o seu maravilhoso pé esquerdo se não fosse aquela noite aziaga de setembro? Quantos anos irá durar o enguiço de Laura? De que mundo vêm as sombras de Ernesto, fabuloso empregado de mesa, Fernando T., assassinado a 26 de dezembro de 1999, Jaime Lopes, fumador de SG Ventil, Hortênsia, que viveu e morreu com medo de tudo? Quando é que Roberto, anjo exterminador, chegará ao bairro para consumar a sua vingança?

Memórias, embustes, traições, homicídios, sermões de pastores evangélicos, crónicas de futebol, gastronomia, um inventário de sons, uma viagem de autocarro, as manhãs de Domingo, meteorologia, o Apocalipse, a Grande Pintura de 1990, o inferno, os pretos, os ciganos, os brancos das barracas, os retornados: a Humanidade inteira arde no Bairro Amélia.



“Verdade e Enigma: Ensaio Sobre o Pensamento Estético de Adorno” de João Pedro Cachopo, Vendaval (Prémio Pen Primeira Obra 2013)

 

Excerto
«[...] o debate em torno da actualidade da estética adorniana transformou-se numa discussão sobre pertinência de uma «estética do enigmático». Uma tal estética visaria prolongar o movimento crítico – para Adorno, o «teor de verdade» – da criação artística e da experiência estética, num «uso desregulador da arte». Este, além de permitir escapar à dicotomia entre «soberania» (verdade) e «autonomia» (aparência) e articular as vertentes afirmativa e negativa da arte, constituiria um modo de disseminar, para além da esfera estética, o potencial crítico da arte – potencial de diferendo e de dissenso –, potencial cujo destino permanece decididamente em aberto.»


  

“Cinza” de Rosa Oliveira, Tinta-da-China (Prémio Pen Primeira Obra 2013)


Sinopse
«"Cinza" é o primeiro livro de poemas de Rosa Oliveira. Cinzas daquilo que fica da memória, ou de uma ideia vaga de "futuro", cinzas que são a melancolia a que chamamos "presente", tempo que passa depressa-devagar, como em Ruy Belo, várias vezes citado. Esta poesia "confessional", mas tão privada quanto política, faz-se da comoção estilhaçada da "Magnólia" de Paul Thomas Anderson mas também das invasões bárbaras que assombram a Europa, invasões que não vale a pena temer, porque já triunfaram. Conceitos como a relatividade e a turbulência ligam misteriosamente as leis da física e a batalha de Waterloo, a destruição de Pompeia e a luta de classes. Rosa Oliveira usa a alusão, a colagem, a sabotagem semântica e o sarcasmo para descrever mudanças, instantes, hiatos irrecuperáveis, tempos perdidos, maravilhas banais da nossa idade. Nos jardins da Gulbenkian como em "santa-clara-a-reciclada", vislumbramos pequenos medos, pequenos nadas, a memória de uma canção, uma vida que talvez esteja acima das nossas possibilidades.»

Por Pedro Mexia

2 comentários:

  1. Há aqui um ou dois que vou comprar na feira.

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    1. Eu também! Confesso que os de poesia, tirando o da Rosa Oliveira, não me cativaram muito. Mas já tinha ouvido falar do "Ara" e fiquei ainda com mais vontade de o ler. O “Que Importa a Fúria do Mar”, o “As Primeira Coisas” e o “Para Que Serve a História?” também me parecem muito interessantes. O problema é que há sempre muita coisa para comprar e uns quantos ficam sempre pelo caminho...

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