quinta-feira, 25 de julho de 2013

4 livros de qualidade para ler no Verão



Ah, as férias de Verão! Essa altura mágica do ano em que suamos em bica, em que qualquer momento na rua que não seja acompanhado por um gelado ou uma bebida fresca parece um sacrifício desumano. Sentimos que podemos mandar no nosso tempo e dedicar-nos àquilo que mais gostamos e então corremos para as livrarias e compramos as Margaridas Rebelo Pinto, os Josés Rodrigues dos Santos e os Paulos Coelhos para nos acompanharem para todo o lado, certo? Errado! Chega de silly literature na silly season!

Um mito que tem sido perpetuado por um certo tipo de intelectuais é o de que a boa literatura tem de ser difícil e quase indecifrável. Pois, mas não tem. O que não faltam são exemplos de livros muito bons e simples, que qualquer pessoa consegue ler facilmente, sem ter de estar de 3 em 3 frases a voltar para trás porque não está a perceber nada do que se passa.

Deixo-vos então com 4 propostas de livros para lerem neste Verão. São 4 livros acima de qualquer suspeita, todos com grandes doses de comédia, bem leves e fluidos como o Verão exige. E a boa notícia é que não precisam de os forrar com folhas brancas! (Pessoas que forram os livros duvidosos a branco para irem a ler no metro, tenho uma notícia para vós: isso não resulta!!! Podemos não saber que livros estão a ler, mas ficamos a saber que algo bom não é. O livro a branco é um chamariz, parece que o ouvimos dizer “Olha para mim! Esta pessoa tem mau gosto!”)


O Complexo de Portnoy” de Philip Roth, Dom Quixote


Se há coisa que aprendemos em todos estes anos a ver séries com humoristas americanos é que as famílias judias têm as suas peculiaridades. Mães possessivas, quase agressivamente intrusivas. E a culpa, esse sentimento que não é exclusivo dos católicos, gerador de tantas frustrações e comportamentos desajustados. De tudo isto nos fala Philip Roth, fazendo uso de uma prerrogativa internacional que diz que apenas podem criticar grupos minoritários quem deles faz parte. Como não gostar de um livro em que a personagem principal, um verdadeiro garanhão, se torna impotente enquanto pisa solo israelita?


A Grande Arte” de Rubem Fonseca, Sextante


Um homem facilmente dominado pela libido a tentar desvendar um crime. E então? Qual é a novidade?! Novidade não haverá, mas há a mestria na escrita e o sentido de humor corrosivo de Rubem Fonseca, vencedor do Prémio Camões em 2003. “A Grande Arte” é uma paródia aos policiais, com cenas e cenas em que o ridículo é continuamente posto à prova, tudo embrulhado em grandes doses de mistério. Aviso: inclui cenas de sexo com prostitutas muito pouco recomendáveis, porque Mandrake, o investigador de serviço, pode até ser bem-parecido, mas quando a natureza o chama, ele tem de responder.


Cândido ou o Optimismo” de Voltaire, Tinta da China


Sim, estou a recomendar um livro de Voltaire como leitura leve de Verão. Os cépticos de serviço estão já a pensar “um livro de Voltaire fácil de ler, sim sim”. É verdade. Acreditem ou não, “Cândido ou o Optimismo” é um livro que se lê de uma assentada. Tudo começa com uma violação e o brutal assassinato de uma família. E de que melhor forma podia começar uma comédia sobre o optimismo? Nenhum homem de boa-fé teceria uma crítica que fosse ao facto de Cândido reencontrar a sua amada Cunegundes algures em Portugal, transformada na escrava sexual do Inquisidor-Mor e de um Judeu, que a repartem segundo os dias da semana. E daqui se parte para um conjunto de peripécias inusitadas, que colocam à prova a crença inabalável de Pangloss, o líder espiritual de Cândido, no optimismo. Para ler, com um prazer muito malicioso.


A Queda de um Anjo” de Camilo Castelo Branco, Civilização


Pronto, está-se mesmo a ver que este livro é um daqueles romances trágicos à Camilo! Não é não senhor. Também eu pensei, quando peguei no livro, que ia ler uma história de amor impossível entre um jovem rebelde que levaria uma inocente rapariga a práticas indecentes, pouco dignas para quem se diz de boas famílias. Em vez disso, deparei-me com Calisto Elói, um bonacheirão como só o interior os sabe produzir, que vem para Lisboa ser político. Calisto chega cheio de si, transpira honra e honestidade por todos os poros, mas ao que parece a carne era fraca e a mulher, que por acaso também era prima, lá fica desterrada na terrinha, enquanto Calisto esbanja os recursos com uma jovem voluptuosa. Que queda! Que anjo!

7 comentários:

  1. Noto que o sexo é um tema comum em todos eles, o que é muito inteligente da tua parte para atrair as atenções para bons livros — e eu ainda não li nenhum!

    Este verão já li O Livro do Ano, do Afonso Cruz (30 minutos); O Perdão dos Pecados, do Antonio Fontana (4-6 horas); Pedro Páramo, do Juan Rulfo (vários dias); e estou agora com Casa de Campo, do José Donoso. Todos eles são boas leituras de verão, excepto o Rulfo — não acredito que seja possível lê-lo na praia =P

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    1. Sim, ler Rulfo na praia pareceria no mínimo estranho!

      O sexo é um motivo importante nos 4 livros, mas há muito mais do que sexo nestes livros. Acho que irias gostar particularmente do "Cândido ou o Optimismo", que por acaso até me foi oferecido por ti :)

      Agora estou no "Memorial do Convento". Está a ser interessante mas exigente. Vamos ver como se desenvolve.

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    2. Já tenho o Cândido na estante, mas ainda não chegou a altura dele. ;)

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  2. Dos quatro só não li A Grande Arte, mas, também, com quatro livros do Fonseca na pilha para ler, não estou com pressa de comprar mais um.

    Esse Camilo foi o meu primeiro e gostei muito dele, muito mais ligeiro e divertido do que esperava. Penso que deveria ser lido em conjunto com O Conde de Abranhos, do Eça, uma sátira à política portuguesa muito superior.

    O Roth é um dos meus escritores favoritos e o Portnoy uma das suas melhores criações; foi o nascimento do Roth como escritor cómico, apesar de também gostar muito dos seus primeiros três livros. Se gostaste deste, tens de ler Our Gang, The Great American Novel e especialmente Operation Shylock, a sua obra-prima do humor.

    Quanto ao do Voltaire, li-o, gostei dele, mas não o considero uma grande obra. É essencial para uma compreensão da história das ideias mas é um panfleto. Acho que a literatura deve ser mais do que isso.

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  3. Luís, acho que o objectivo do Camilo não era tanto satirizar a vida política mas mostrar o quão frágeis são as convicções, mesmo as que parecem mais firmes, dadas as condições certas. E ver a forma como o Calisto Elói engole toda a sua honra, em troca de uns serões bem passados, é simplesmente maravilhoso.

    Percebo o que dizes do Voltaire, mas acho que é exactamente por isso que é uma grande obra, porque é uma sátira levada ao extremo. Se fosse um livro com momentos ridículos entremeados com momentos em tom mais sério e respeitável, concordaria contigo. Mas agrada-me muito que ele não se tenha contido e que tenha escrito uma história profundamente disparatada, que é o que a torna tão boa e um momento incontornável da literatura humorística.

    Ficam registadas as recomendações de livros do Roth e quando leres os livros do Rubem Fonseca diz qualquer coisa, porque queria comprar outros dele e é sempre bom conhecer a experiência de outras pessoas!

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    1. Devia ter acrescentado que já li Agosto e adorei; o Fonseca anda a tornar-se um dos meus escritores favoritos.

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    2. Óptimo! Acabaste de me facilitar a vida!

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