Facto: Saul Bellow é um dos escritores mais importantes do
século XX, mais que não seja porque escreveu “Herzog”, “As Aventuras de Augie March” e “Henderson, O Rei da Chuva”, todos eles inseridos em diferentes
listas de melhores livros (da Time e da Modern Library, por exemplo). E já
agora, porque ganhou o Pémio Nobel da Literatura. Facto: o conto que a Granta
nos apresenta da sua autoria, “Memórias do Filho de um Contrabandista”, não
está à altura do nome que o escreveu.
É um texto sem sabor. Começamos a ler e a história parece
interessante: os esforços de um pai, imigrante russo judeu, para singrar no
Canadá, dedicando-se a vários negócios destinados ao fracasso. Mas algo falha
redondamente na forma como a história é contada. Há um enorme desapego para um
conto de um filho a falar do pai, há uma quase frieza, uma entediante placidez de discurso. E esperamos que aquela
história chegue a algum lado, mas não chega, parece que enveredámos por uma rua
sem saída e que chegamos ao fim e ficamos no carro a olhar para a parede.
Uma nota final esclarece as razões do
insucesso deste conto. Na verdade Saul Bellow tinha começado a escrever um
romance com o mesmo nome, mas abandonou o projecto (sábia
decisão!). Anos depois, os responsáveis da Granta, tendo acesso ao manuscrito, acharam
que daria um conto interessante. E, nessa tentativa de transformar algo numa
coisa que não é, criou-se um conto vazio, que parece pobrezinho ao lado do do
Valério Romão.
Compreendo a decisão de incluir numa revista de literatura
um conto de um Prémio Nobel. Pudessem todas as revistas ter essa hipótese! Mas
a verdade é que este conto não deixará boas recordações aos leitores da Granta.
Esperemos que o do Orhan Pamuk seja melhor.
João, como me sinto aliviada ao ler a tua opinião sobre esse texto do Saul Bellow. É que senti exactamente o mesmo. Tinha tanta expectativa em relação ao texto do Saul Bellow e saíram goradas. Resta-me ler três obras do
ResponderEliminarautor que tenho lá por casa, "Herzog", "Ravelstein" e "As Aventuras de Augie March", este último, das primeiras páginas lidas, me pareceu ser uma história cheia de pormenores, personagens e com um bom ritmo narrativo, a fazer-me recordar o magnífico "Servidão Humana" ou diria eu "As Aventuras de Philip Carey" :)
Ainda não li todos os textos da Granta, aliás na verdade li muito poucos, mas até ao momento o que mais me marcou foi o da Dulce Maria Cardoso. Que não foi uma total surpresa pois já tinha ficado rendida ao seu estilo em "O Retorno".
Quanto ao decepcionante texto do Saul Bellow só posso concluir que a mania de depois de morto um vulto da literatura, ir vasculhar e publicar tudo quanto é papelinho escrito pelo falecido, nem sempre dá bom resultado. Fez-me recordar de uma notícia que ouvi sobre os escritos do J.D. Salinger. http://globotv.globo.com/globo-news/estudio-i/v/j-d-salinger-teria-deixado-cinco-romances-ineditos-diz-new-york-times/2785334/
A publicação do texto "Memórias do Filho de um Contrabandista" deveu-se ao nome sonante de quem assinou o texto e não à sua qualidade. Esperemos que o mesmo não aconteça com o Salinger.
Tânia
Olá Tânia!
EliminarTenho também uns 4 ou 5 livros do Saul Bellow (que ainda não li) e pelas primeiras páginas fiquei muito motivado para ler o “Ravelstein”. Confesso que agora a minha motivação já não é tanta, mas vamos acreditar que este conto foi um episódio isolado. Mas o pior é que nem podemos atribuir a sua divulgação à voracidade das edições póstumas (sobre as quais tenho algumas reservas, assunto que abordarei num post futuro, unindo-me a ti no receio que a divulgação das obras do Salinger não lhe venha fazer justiça), porque foi ainda em vida de Saul Bellow que a Granta inglesa publicou este conto. Não tenho nada contra Prémios Nobel, antes pelo contrário, mas acho que com o prémio vem uma responsabilidade que deveria evitar que textos menores chegassem ao público.
Na Granta, estou exactamente no conto do Saul Bellow. Vou escrevendo sobre os contos à medida que os vou lendo e nos próximos dias vou ler e escrever sobre o da Hélia Correia. Até ao momento, dos que li, gostei bastante do da Dulce Maria Cardoso, mas o que mais gostei foi o do Valério Romão (de uma forma perturbadora, diga-se).
Bem, era o que te queria dizer na sms que te enviei mal acabei de ler o conto — que desilusão :( Agora estou no conto do Simon Gray.
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