Há 2 anos dediquei-me à hercúlea tarefa de calcorrear a base
de dados de nomeados ao Nobel da Literatura até 1950, em busca de candidatos
portugueses e publiquei nessa altura um artigo que agora se poderá considerar como uma primeira parte deste. Desde então a Academia
disponibilizou mais dados, permitindo que acompanhemos o processo de nomeação
até ao longínquo ano de 1964 e, desde 1950 até essa data, surgiram mais nomes de
autores portugueses.
Na verdade são 4 os nomes portugueses apresentados ao
julgamento da Academia entre 150 e 1964, um deles já anteriormente nomeado.
Falo de Júlio Dantas, que em 1951 foi nomeado pelo antigo Primeiro-ministro
sueco Hjalmar Hammarskjöld e pela Academia Brasileira. Mas como já falei com
maior detalhe sobre este autor no artigo anterior, vou escusar-me a repetições
e focar-me nos 3 nomes novos.
Ferreira de Castro
Sofrido escritor português que se viu obrigado a emigrar
para o Brasil aos 12 anos e que, após algum sucesso no outro lado do Atlântico,
volta a Portugal para uma vida de miséria, a que apenas o seu génio conseguiu
pôr fim com a publicação de “A Selva”. Para quem muitas vezes quase nada teve
para comer, as nomeações ao Nobel pelo professor dinamarquês Holger Sten e em
1952 pelo historiador João de Barros devem ter-lhe sabido particularmente bem.
E melhor lhe teria sabido saber que não cairia no esquecimento, e que 40 anos
depois da sua morte a Cavalo de Ferro assumiria o compromisso de trazer de volta ao grande público a sua obra.
Aquilino Ribeiro
De anarquista perigoso, várias vezes detido, a ilustre
membro do Panteão Nacional, Aquilino Ribeiro teve uma vida muito atípica que
nos legou uma obra que muitos consideram como uma das mais importantes das
Letras portuguesas. A prová-lo está a nomeação em 1960 ao Prémio Nobel da
Literatura pela Sociedade Portuguesa de Autores, que contou com a subscrição de
nomes como Cardoso Pires, Vergílio Ferreira, Alves Redol, Vitorino Nemésio e
Urbano Tavares Rodrigues. Também Aquilino sobreviveu às agruras do tempo, sendo
de elogiar a persistência com que a Bertrand tem reeditado a sua obra.
Miguel Torga
Um nome incontornável da literatura portuguesa, Miguel
Torga, de seu verdadeiro nome Adolfo Correia da Rocha, foi médico para além de
escritor. Mas em vez de o distrair da escrita, a sua profissão fortaleceu a sua
consciência do outro, já bastante alimentada pelas suas origens humildes. Torga
foi continuamente nomeado ao Nobel entre 1959 e 1962, sempre pela mão de
professores universitários, entre os quais Émile Planchard e Hernâni Cidade.
Também a sua obra sobreviveu e tem merecido belíssimas edições da D. Quixote.
E em 2015? Vamos ter um Nobel de língua portuguesa?
É possível. As minhas apostas são exactamente as mesmas que no ano passado, porque os pressupostos se mantém. A Academia continua em dívida
para com a língua portuguesa e África, o que torna Mia Couto numa possibilidade
muito apetecível. Por outro lado, ao falar de escritores em língua portuguesa é
difícil não olhar para o Brasil e Ferreira Gullar permanece em evidência, tendo
alguma projecção internacional. Mas a Academia pode bem focar-se apenas no
factor África e, se assim for, Ngũgĩ wa Thiong'o tem sido apontado como um
favorito.
Mas este ano avanço com outro cenário: após entregar o
prémio a Modiano, um autor quase desconhecido a nível internacional, talvez a
Academia queira apresentar este ano um escritor de grande perfil. E nesse caso
surge outra área geográfica onde proliferam grandes autores e escasseia o reconhecimento
do Nobel: os EUA. Philip Roth é o nome óbvio, mas tendo parado de escrever parece-me
pouco provável que a Academia o eleja, parecendo-me que há outra hipótese
aliciante: Joyce Carol Oates. Mas os desígnios da Academia são insondáveis e quase
certamente o escolhido será uma enorme surpresa para todos. Veremos, dentro de
algumas horas…
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