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terça-feira, 1 de abril de 2014

Em estado crítico: "Uma Barragem Contra o Pacífico" de Marguerite Duras


A força incontrolável do mar e do destino. Por muito que nos enganemos, que nos tentemos convencer de que os controlamos, no final reconheceremos a sua supremacia. Por muito que desejemos que o mundo pare, que um momento se cristalize no tempo e se converta em infinito, a mudança virá e, como uma torrente de água, levará consigo tudo o que encontrar à sua frente. Assim acontece com a família de “Uma Barragem Contra o Pacífico”, uma obra-prima por direito próprio, que apenas não é a grande obra de Marguerite Duras porque muitos anos mais tarde “O Amante” seria escrito, e o que poderia haver de imperfeição no primeiro livro foi obliterado pela pureza aprimorada do segundo.

O ponto de partida para ambas as histórias é o mesmo: uma viúva com filhos para criar decide investir as suas economias numa concessão atribuída pelo governo da Indochina, com a esperança de que a exploração dessa terra seja a solução para os seus problemas financeiros e uma porta para a riqueza. O pior acontece quando percebe ter sido enganada, assistindo indefesa às terras da sua concessão serem dragadas pelas águas do Pacífico durante grande parte do ano, impossibilitando o seu cultivo. Numa tentativa desesperada, manda erguer uma espécie de barragem para conter as águas do mar, sem que o seu propósito seja alcançado. Vê-se então sozinha em plena selva da Indochina, com os seus filhos e sem forma de subsistir, condenada a uma vida de miséria

A irmã, o irmão e a mãe de “Uma Barragem Contra o Pacífico” conhecerão portanto uma nova existência em “O Amante”, mas com algumas diferenças. Nesta primeira história a rapariga, Suzanne, uma personificação de Duras enquanto jovem na Indochina, é menos melancólica e ensimesmada, assim como o irmão é também mais vivaz. A mãe permanece inalterável. Mas fora deste núcleo familiar, há diferenças consideráveis nas duas histórias: em “Uma Barragem Contra o Pacífico” não há irmão mais velho, o irmão cruel que absorverá todo o amor da mãe, e também não há sentimentos genuínos pelo amante. O Sr. Jo, o rico pretendente deste livro, está muito distante da figura sedutora e intensa de “O Amante”, uma figura capaz de fazer uma jovem desesperada sentir amor. O Sr. Jo resume-se ao ridículo e à perversidade, numa existência plena de humilhação e cobardia.

Enquanto em “O Amante” há uma dinâmica entre forças endógenas e exógenas à família, em “Uma Barragem Contra o Pacífico” tudo é a família e, mais que isso, tudo é a mãe, essa mulher louca, tão profundamente destruída pela vida que, começando por ser uma heroína estóica, se torna numa mulher dominada pela injustiça e pela incapacidade de fazer algo, numa mulher que nada mais tem do que os seus dois filhos. E o amor que os une, embora seja um sentimento sobretudo destrutivo (mas o amor em Duras é sempre uma força destruidora), é o ponto criador de equilíbrio e que permite à família sobreviver a tudo. A partida de Joseph, o irmão, há tanto antevista e temida pela mãe, terá por isso uma importância tão significativa, acabando por ser o início do fim e um mero prelúdio do inadiável desfecho da história.

O desejo incestuoso da Suzanne pelo seu irmão, embora nunca seja afirmado de forma peremptória, é neste livro mais presente. No final é por ele que ela espera junto à estrada, em frente da casa, embora queira fazer crer que aguarda por um homem que a leve dali e ao qual se renderia de imediato porque sabe que não é mais do que uma mercadoria sem outra utilidade que garantir o salvamento económico da família.

Suzanne e a mãe desejam, acima de tudo, que o tempo pare e que possam viver eternamente naquele bungalow, construído junto à sua estéril concessão, com Joseph. Os três alimentando um ódio silencioso, estridente aquando dos ataques da mãe, contra as autoridades coloniais que os enganaram, contra os homens ricos que cobiçarão Suzanne e que pensarão que a poderão comprar com o seu dinheiro. Mas esse tempo acabará, sem que nenhuma barragem o consiga evitar, porque no fim apenas haverá a solidão e a certeza de que o destino, como a água do mar, seguirá o seu rumo.

“Uma Barragem Contra o Pacífico” apresenta-nos uma Duras disciplinada, seguindo um modelo mais tradicional de romance, num estilo que, possuindo já os motivos que caracterizariam toda a sua obra, não se encontrava ainda completamente formado. Mas a capacidade de evocar imagens poéticas e de chocar pela profundidade honesta dos sentimentos revela uma escritora com uma capacidade única: a de criar uma história que nos incomoda, nos faz sair do nosso centro e que gera entre nós e as personagens, mesmo aquelas que não nos são muito simpáticas, um elo de compreensão. Um romance maior do séc. XX.

Classificação: 19/20

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Apresentada a Longlist do The Man Booker Prize 2013



A 15 de Outubro conhecer-se-á o vencedor deste ano do The Man Booker Prize, que premeia a melhor obra de ficção em inglês publicada por um cidadão da Commonwealth, da Irlanda ou do Zimbabué. Para já foram anunciadas as 13 obras que estão sob consideração do júri. Num processo muito menos secreto do que o do Nobel da Literatura, a eleição do Man Booker Prize inicia-se com a definição da Longlist, que será depois reduzida a 5/6 obras (a Shortlist, que este ano será conhecida a 10 de Setembro), das quais sairá a vencedora.


Fazem este ano parte da Longlist:
Five Star Billionaire” de Tash Aw
 “We Need New Names” de NoViolet Bulawayo
The Luminaries” de Eleanor Catton
Harvest” de Jim Crace
The Marrying of Chani Kaufman” de Eve Harris
The Kills” de Richard House
The Lowland” de Jhumpa Lahiri
Unexploded” de Alison MacLeod
TransAtlantic” de Colum McCann
Almost English” de Charlotte Mendelson
A Tale for the Time Being” de Ruth Ozeki
The Spinning Heart” de Donal Ryan
The Testament of Mary” de Colm Tóibín



Curiosidades:

Destas obras, apenas 1 já está publicada em Portugal: “O Testamento de Maria” de Colm Tóibín, publicada pela Bertrand.


3 autores são repetentes nas andança do The Man Booker Prize: “The Harmony Silk Factory” de Tash Aw chegou à Longlist de 2005; Jim Crace esteve na Shortlist de 1997 com “Quarantine”; também na Shortlist, e por 2 vezes, esteve Colm Tóibín, com “The Blackwater Lightship” em 1999 e “The Master” em 2004.


Jhumpa Lahiri venceu o Pulitzer Prize for Fiction em 2000 com Interpreter of Maladies”.


O conto “Everything in this Country Must” de Colum McCann originou uma curta-metragem nomeada aos Óscares em 2005.


Dos 13 autores considerados, 6 têm obras traduzidas em português: 
   Tash Aw

A Fábrica das Sedas” (Difel)

   Eleanor Catton

O Ensaio” (Gradiva)

   Jim Crace

Quarentena”, “A Morte nas Dunas” e “Arcádia” (Gradiva)

   Jhumpa Lahiri

Intérprete de Enfermidades” e “O Bom Nome” (Dom Quixote)

 Numa Terra Estranha” (Presença)

   Colum McCann

Deixa o Grande Mundo Girar” e “Deste Lado da Luz” (Civilização)

O Bailarino” (Bizâncio)

   Colm Tóibín

O Mestre” e “O Navio-Farol de Blackwater” (Dom Quixote)

O Testamento de Maria”, “Brooklin” e “Mães e Filhos” (Bertrand)

“A História da Noite” (Bizâncio)

quarta-feira, 10 de julho de 2013

A dependência dos livros: edição Julho de 2013 (adenda)




E o mês sem livros, transformou-se num mês normal. Decidido que estava a não comprar livros em Julho (plano que tinha tudo para falhar, e falhou), para além das compras que me vi “obrigado” a fazer (com muito sacrifício pessoal!), eis que recebo uma mensagem do serviço de alfarrabista da Pó dos Livros a informar-me que 2 dos livros que encomendei estavam disponíveis: “A Gente de July” da Prémio Nobel Nadine Gordimer e “Nove Contos” de J. D. Salinger. Livros que estão fora de circulação e que apenas um alfarrabista de excelência, como é a Pó dos Livros Vintage, conseguiria encontrar em tão curto espaço de tempo. 

Valeu-me o patrocínio da figura da paterna que arcou com a despesa em jeito de prenda de aniversário atrasada. Haja prateleira!