segunda-feira, 30 de março de 2015

A dependência dos livros – edição Março de 2015


A promoção que assinala os 80 anos da Penguin prometia ser uma boa fornecedora de livros para a minha biblioteca, coincidindo com uma vontade que tenho tido de aprofundar os meus conhecimentos de clássicos gregos e latinos. Não é pois de espantar que, custando cada livro uns meros 80 pence, 10 deles tenham vindo para às minhas mãos e sem sentimentos de culpa, afinal de contas, tendo contado com a cumplicidade de uma amiga, fugi aos portes de envio e gastei apenas 11€. Vamos lá então à lista:

Calígula” de Suetonius
Jason and Medea” de Apollonius of Rhodes
Trimalchio’s Feast” de Petronius
The Beautifull Cassandra” de Jane Austen
The Great Winglebury Duel” de Charles Dickens
The Atheist’s Mass” de Honoré de Balzac
Antigone” de Sophocles
The Night Is Darkening Round Me” de Emily Brontë
The Fall of Icarus” de Ovid
The Madness of Cambyses” de Herodotus

Em Março houve ainda tempo para regressar ao Sr Teste e comprar 2 livros de Prémios Nobel totalmente esquecidos pelas nossas editoras: “A Vida das Térmitas” de Maurice Maeterlinck e “Cinzas” de Grazia Deledda. Recebi também uma chamada do serviço vintage da Pó dos Livros, a avisar-me que tinham conseguido o 4º volume das obras completas de Bernardo Santareno, pelo que se saldou como bem-sucedido o meu esforço para comprar todos os volumes.

Numa trágica encomenda da Fnac, “Lôá e a Véspera do Primeiro Dia” de Dulce Maria Cardoso foi o único livro que chegou até mim em condições. Era minha intenção comprar “A Breve e Assombrosa Vida de Oscar Wao” de Junot Díaz, mas o péssimo serviço de Fnac entrepôs-se entre mim e a minha vontade, pelo que I'll take my money somewhere else!

E por falar em bons sítios para gastar dinheiro, e com serviços de qualidade, tinha comprado na Wook “O Horizonte” de Patrick Modiano e estava crente que este mês ficaria por aqui. Mas, numa excelente iniciativa a assinalar o relançamento da Livros do Brasil, recebi um email da Wook com uma oferta de 5€ de desconto na compra de um dos títulos que voltaram recentemente às livrarias e estando “A Condição Humana” de André Malraux há algum tempo na minha lista de compras, não é muito difícil imaginar o que se seguiu.

Muitos livros por pouco dinheiro: o Paraíso.

sexta-feira, 27 de março de 2015

Discurso Directo: Recordar Tomas Tranströmer


“Fantastic to feel how my poem grows
while I myself shrink.
It grows, it takes my place.
It pushes me aside.
It throws me out of the nest.
The poem is ready.”

(excerto do poema “Morning Birds”)

Mia Couto finalista do The Man Booker International Prize 2015


O prestígio internacional de Mia Couto é um facto incontestável, e após ter vencido o Neustadt e de “Terra Sonâmbula” ter sido considerado um dos 12 melhores livros africanos do século XX, Mia Couto figura agora na lista dos 10 finalistas do The Man Booker International Prize 2015. Este prémio, que à semelhança do Neustadt e do Nobel premeia o conjunto da obra de um escritor, é atribuído de 2 em 2 anos, sendo o vencedor de 2015 anunciado no próximo dia 19 de Maio.

Para além de Mia Couto, a lista de finalistas inclui 9 nomes que, confesso, desconheço por completo:




César Aira

Autor argentino com 2 livros editados em Portugal pela Assírio & Alvim: “Como me Tornei Monja” e “Um Episódio na Vida do Pintor Viajante”.








Ibrahim al-Koni

De origem Líbia, venceu em 2005 o Mohamed Zefzaf Prize for the Arabic Novel e em 2008 o Sheikh Zayed Award for Literature.






Hoda Barakat

Nascida em Beirute, venceu o al-Nagid Award com “The Stone of Laughter”, o primeiro romance árabe a ter como personagem central um homem homossexual, e a Naguib Mahfouz Medal for Literature com o romance “The Tiller of Waters”.











Maryse Condé

Académica que nasceu em Guadalupe.







Amitav Ghosh

Autor de origem indiana, cujo livro “Mar de Papoilas”, publicado em Portugal pela Presença, chegou à shortlist do The Man Booker Prize em 2008. Venceu vários prémios internacionais, entre os quais o Prix Médicis e o Arthur C. Clarke, estando também publicado em Portugal “O Cromossoma de Calcutá”, pela Replicação.








Fanny Howe

Poeta e romancista americana, venceu em 2009 o Ruth Lilly Poetry Prize.










László Krasznahorkai

Autor húngaro, vencedor em 1993 do alemão Bestenliste-Prize.








Alain Mabanckou

Oriundo do Congo, foi considerado pela Lire e pela Vanity Fair um dos 50 escritores a que devemos estar atentos, tendo vencido o Grand Prix de la Littérature Henri Gal e o Sub-Saharan African Literature Prize, entre outros. “Memórias de Porco-Espinho” foi publicado em Portugal pela Europress.







Marlene Van Niekerk


Autora sul-africana, vencedora do Hertzog Prize em 2007.

sábado, 21 de março de 2015

Discurso Directo: Adília Lopes e a fascinação


Um pequeno recital de poesia a assinalar o Dia Mundial da Poesia que hoje se comemora. E para mim, nos últimos tempos, poesia tem sido sinónimo de Adília Lopes, uma figura que me tem fascinado pela simplicidade aparente dos seus poemas, quase ingénuos, e pela sua existência num mundo tão distante do nosso, de olhares bucólicos para um tempo que passa devagar. 

quinta-feira, 19 de março de 2015

O que é que a Granta tem: “Híma” de Luísa Costa Gomes


Um curto conto moral em que Luísa Costa Gomes nos relata a saga da construção de um barco na Islândia, em que as múltiplas peripécias se apresentam como uma força incontornável do destino empenhada em contrariar as vontades dos homens. No pólo oposto os cavalos islandeses que enfrentam as intempéries baixando a cabeça e fincando os cascos no chão, personificando o Híma, a espera resignada mas firme.

Como diriam os brasileiros, para quê dar murros em pontas de facas, tentando contrariar o fatal? Por vezes o melhor a fazer é permanecer imóvel e deixar que o destino siga o seu curso. Contra o poder dos imprevistos, o poder da resistência. E os barcos acabarão por se construir e os cavalos por escapar às fúrias dos ventos.

terça-feira, 17 de março de 2015

Ler o último livro de Saramago


Saramago merece que respeitemos a sua obra. Mas, ao contrário do que muitos pensam, respeitar a obra de um grande autor não é elogiá-la ou adoptar uma postura devota. Respeitar um autor é lê-lo, criticamente, sem condescendências, e partir dessa base para uma análise fundamentada. Infelizmente parece-me que não foi esse o tratamento dado a “Alabardas, Alabardas, Espingardas, Espingardas”, o livro inacabado em que Saramago trabalhava quando morreu.

Pouco depois de o livro ter sido publicado pela Porto Editora formaram-se duas correntes antagónicas, mas igualmente perversas. De um lado os detractores de Saramago e os que não se deram ao trabalho de ler o livro, preferindo apelidá-lo de engodo meramente com base em questões de formato. Só três capítulos? Com letra enorme, ainda por cima? Para quê os destaques a vermelho no texto, que se intrometem na experiência do leitor? Para quê as ilustrações? Os textos do Fernando Gómez Aguilera e do Roberto Saviano são só para encher? E em todas estas questões, que na altura foram feitas, de tudo se falou menos do conteúdo do texto.

Do outro lado os fãs incondicionais de Saramago, que irresponsavelmente se apressaram a considerar “Alabardas” um exemplo de Saramago no seu melhor, havendo mesmo quem o classificasse como um dos melhores livros do ano. Rapidamente surgiram pontes que ligaram as personagens de “Alabardas” às figuras de proa da mitologia Saramagiana, sem perceberem que o principal prejudicado é Saramago, que colocar “Alabardas” ao nível dos seus melhores livros é colocar em causa a qualidade de uma obra tão arduamente construída.

Como de costume, é no meio que está a virtude, e é algures no meio que me encontro. A componente estética do livro não me incomoda. É um livro de homenagem, parece-me normal e até interessante esta tentativa de repensar o grafismo. E por princípio as ilustrações e os textos extra não violam a minha consciência de leitor. Mas na prática desiludiu-me o carácter algo aleatório das ilustrações, cuja ligação ao texto me pareceu bastante forçada. E mais me desiludiram os textos de Aguilera e de Saviano. O primeiro por repetir ipsis verbis as notas deixadas por Saramago que são apresentadas nas páginas anteriores. Para quê repetir algo que se acabou de ler? E Aguilera não resiste a comparar Felícia, a mulher do protagonista, a Blimunda, o que eu classificaria como um acto criminoso. O texto de Saviano é mais interessante, mas também não se coíbe de elevar Artur Paz Semedo a um estatuto que o pouco que Saramago escreveu não nos permite considerar razoável.

Mas o problema de base é que “Alabardas” não é um livro, é um projecto, e é dessa forma que deveria ser tratado. Nos três breves capítulos, Saramago tem tempo para pouco mais do que posicionar as peças no tabuleiro, criando os primeiros alicerces da narrativa. Tentar deste esqueleto inferir significados é um exercício especulativo. A ideia base de Saramago é muito interessante, explorar o porquê de nunca ter havido uma greve na indústria do armamento, mas não é claro de que forma pretendia analisar a questão. O que chegou até nós é um homem curioso, que se propõe investigar qual o posicionamento da fábrica em que trabalha nos principais conflitos armados do século XX. Apenas isto. Uma visão desapaixonada e sem uma moral última, que viria a ter certamente, mas que não houve tempo de construir.

A sensação de falta de tempo é aliás algo que transparece muito na escrita. Saramago que costuma respirar pausadamente, caminhando num passo firme e sereno, com uma noção de ritmo e uma gestão da narrativa irrepreensível, é em “Alabardas” um escritor apressado, que cavalga de frase em frase, com reminiscências do seu estilo oracular, mas com passagens abruptas e muitas palavras que ficam por dizer.

E chegamos ao momento em que a pergunta se impõe: “Alabardas” deveria ter sido publicado? Todos conhecem as minhas reservas quanto a obras póstumas e, se me coubesse a decisão, possivelmente não o teria feito. Mas percebo as motivações dos herdeiros que quiseram trazer à luz do dia uma obra que Saramago temia nunca chegar aos leitores, especialmente pelo debate que poderia promover. Proporcionar uma discussão alargada sobre a temática da guerra é uma boa e merecida homenagem a Saramago, e por isso acho que a publicação valeu a pena.

“Alabardas” não é Saramago no seu melhor. Mas um Saramago fora de forma ainda consegue valer mais do que muitos escritores no auge da sua pujança.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Contando contos de Edgar Allan Poe: “O Embuste do Balão”


Poe parece ter uma obsessão com balões. Depois de em “A Aventura Sem Paralelo de Um Tal Hans Pfaall”, a história que abre "Todos os Contos", nos relatar uma falsa viagem de balão que teria levado Hans Pfaall à Lua, decide agora ver se acreditamos que em 1844 um balão atravessou o Atlântico em 75 horas, num embuste com direito a publicação no New York Sun.

Rico em pormenores técnicos, na verdade “O Embuste do Balão” pouco mais é que uma versão simplificada de “A Aventura Sem Paralelo de Um Tal Hans Pfaall”. Até mesmo a base para a narrativa - um diário mantido durante a viagem – é a mesma em ambas as histórias. Nem sequer a viagem em si é particularmente excitante. É tudo muito fácil, muito sereno, muito rápido. Há portanto pouco que possa ser dito sobre o valor literário deste artigo.

O facto mais curioso talvez seja que apenas em 1978 seria completada a primeira travessia do Atlântico por balão, pelo Double Eagle II, demorando mais de 137 horas. Poe era afinal um optimista!

terça-feira, 10 de março de 2015

Em estado crítico: “Dora Bruder” de Patrick Modiano


Recordaremos Dora Bruder? Olharemos para as ruas que ela percorreu e veremos a sua sombra a projectar-se nas paredes, as suas passadas adolescentes a dançarem sobre as pedras da calçada? Sentiremos a sua presença e sem a ter visto saberemos quem ela é?

A ideia de que Modiano partiu para criar “Dora Bruder” reserva em si uma perfeição serena, a verdadeira essência da memória e da tentativa de recuperar os mundos que se perderam na voracidade do tempo. Um homem, o narrador do livro, lê num jornal antigo um anúncio em que os pais de Dora Bruder procuravam a sua filha desaparecida e decide tentar descobrir quem é aquela rapariga de 15 anos e que sorte lhe estava reservada. Não é em Dora Bruder que o livro se centra, nem no narrador, quanto muito será na procura em si, com o narrador a permanecer quase sempre distante, escudado nos relatos factuais das poucas descobertas que vai fazendo.

Ao investigar percebe que alguns locais de Paris que fizeram parte da vida de Dora, foram também ruas percorridas por si, casas para que olhou diariamente, sítios que tão bem conhece, sentindo a melancolia de quem passou por aqueles espaços desconhecendo a sua história. A nostalgia de perceber que os locais sobreviverão sem memórias de quem os habitou, como se sempre tivessem permanecido vazios antes de entrarem na nossa vida.

Pouco ficaremos a saber do narrador. Há uns breves relatos sobre o seu pai, que o abandonou na juventude e que nunca viria a reencontrar. Nesta história, neste desaparecimento do pai, podemos antever as motivações para descobrir o que aconteceu a alguém que, em vez de procurar os pais, era procurada por eles. Mas a verdade é que Modiano não nos alimenta essas interpretações, não as impede, mas certamente não nos dá material suficiente para as sustentarmos.

É aliás esse o problema de “Dora Bruder”: o quão desconstruída é toda a narrativa. Modiano apontou para a simplicidade, mas exagerou e caiu no simplismo. “Dora Bruder”, partindo de uma ideia genial que tinha tudo para gerar um livro que, ao contrário da rapariga que lhe deu o nome, perdurasse, acaba por ser pouco mais do que meia dúzia de factos recolhidos e apresentados de forma muito ligeira, como se estivéssemos a ler as notas despreocupadas no caderno pessoal de um investigador.

Para não esquecermos “Dora Bruder” precisávamos de mais. Precisávamos de um momento de génio que resgatasse o livro de uma existência tão ténue que quase nos desaparece nas mãos. Modiano não me convenceu desta vez.

Classificação: 13/20


Nota: este livro foi editado originalmente em Portugal pela Edições ASA (sendo essa a minha edição), mas o livro foi recentemente republicado pela Porto Editora.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Cheiro a livro novo - Fevereiro de 2015


Fevereiro é o mês do amor e o Cupido deve ter feito das suas e entretido os editores nacionais, sobrando-lhes pouco tempo para nos trazerem novos livros. Mas, não sendo uma amostra extensa é certamente interessante.

A Cavalo de Ferro focou-se em autores premiados e, de uma assentada, publicou “O Livro de Jón” de Ófeigur Sigurðsson, vencedor do Prémio da União Europeia para a Literatura, e “Thérèse Desqueyroux” uma das obras-primas da literatura do séc. XX e o livro mais proeminente do Prémio Nobel François Mauriac. Também a Sextante se manteve no mundo dos prémios, mais concretamente do Goncourt, editando o romance que recebeu o maior galardão da literatura francesa em 1956: “As Raízes do Céu” de Romain Gary.

Mas o principal lançamento do mês é uma surpresa, vindo inesperadamente de uma editora do Grupo Leya, cujo estado moribundo é já difícil de esconder. A Caminho traz-nos então a trilogia de Alves Redol que se desenrola na região vinícola do Alto Douro - o “Ciclo Port Wine” – e que é composta pelos romances “Horizonte Cerrado”, “Os Homens e as Sombras” e “Vindima de Sangue”.
Mantendo-nos na literatura em língua portuguesa, “O Irmão Alemão” de Chico Buarque foi a obra escolhida para apresentar a Companhia das Letras ao mercado nacional, esperando-se para breve mais novidades editoriais.

E terminamos como de costume com a não-ficção, curiosamente com 2 livros de focados em escritores portugueses. A abysmo traz-nos “Regressar a Casa com Manuel António Pina” de Inês Fonseca Santos, que inclui uma entrevista ao autor, um ensaio sobre a sua poesia e ainda um documentário em curta-metragem dedicado ao tema da casa. Já a Tinta-da-China mantém-se fiel a Fernando Pessoa e editou “Sobre o Fascismo, a Ditadura Militar e Salazar”, que reúne todos os escritos do autor sobre o Estado Novo, contando com a edição de João Barreto.

domingo, 1 de março de 2015

A dependência dos livros - edição Fevereiro de 2015


Proporcionalmente à pequenez de Fevereiro, as minhas compras do mês foram menores do que habitualmente. Mas, fazendo jus à sabedoria popular, quantidade não é qualidade, e estou muito contente com os livros que comprei.

Aproveitando os saldos da Wook, em que alguns livros estavam com 50% de desconto, comprei o “Travessa d’Abençoada” de João Bouza da Costa, vencedor do Prémio PEN Narrativa, e também “Falconer” de John Cheever, que já estivera várias vezes na eminência de entrar para a minha biblioteca.

A Fnac parece empenhada em manter a excelente tradição de ter 48h dedicadas a uma editora, com uma selecção de livros com 50% de desconto. A Teorema foi uma das editoras reverenciadas com esta promoção em Fevereiro (a Relógio d’Água também o foi, mas numa altura em que o orçamento mensal estava já moribundo!) e após alguma ponderação optei por “O Mal de Montano” de Enrique Vila-Matas, considerado um dos melhores romances em espanhol do século XXI.

Para terminar, e assinalando a recente proximidade a que me encontro diariamente de uma Bulhosa, comprei um exemplar sobrevivente de “O Vice-Cônsul” de Marguerite Duras, editado pela falecida Difel. Depois de vários anos de namoro, finalmente tenho-o na minha prateleira!