A Feira do Livro de Lisboa é um espaço de loucura e prazer,
onde os devotos da literatura se entregam cegamente ao crime de comprar e
comprar até que a conta bancária exígua se revolta e diz “não voltarás àquele
antro de perdição”.
Quem me conhece sabe que a Feira do Livro ganhou na minha
vida uma dimensão ritualística semelhante ao Natal. Doces, momentos de convívio
com aqueles de quem mais gostamos e muitas prendas (compradas por nós, mas a
preços que quase parecem uma oferta), que mais pedir a Deus! E foi assim que
entre farturas e cones de batatas do Chippers, livros foram sendo comprados.
Alguns impulsivamente (poucos!), a maioria estudada criteriosamente (não estou
a exagerar!). O resultado foi um conjunto de respeito, que vos apresentarei em
três grupos.
Autores lusófonos e Prémios Nobel
No passado teria comprado pouca coisa de autores lusófonos mas perante a minha recente proclamada dedicação a esta literatura, após algumas
óptimas experiências, este ano teria de haver muitas compras em português e foi
nesse grupo que fiz algumas das minha melhores compras. Antero de Quental é um
autor que me tem despertado muito interesse e já tinha feito uma pequena
investigação, estando ciente que não há muitos livros dele no mercado, razão
pela qual este autor tem a honra de ser o único do qual comprei mais do que um
livro: “Causas da Decadência dos Povos Peninsulares”, numa edição deslumbrante
da Tinta-da-China, e “Odes Modernas”, uma edição velhinha da Vega.
“O Vale da Paixão” da Lídia Jorge e “Contos” do Miguel Torga
foram duas compras muito felizes, quase a 1/3 do seu preço normal. Ter os
contos completos do Miguel Torga por menos de 10€ é notável e, não menos
notável, é comprar um dos livros mais emblemáticos de Lídia Jorge por menos de
5€. E não posso deixar de mencionar a aquisição para a minha biblioteca do
primeiro Dalton Trevisan, que já estava nos meus planos há algum tempo. O facto
de ter custado 5€ só me deixou ainda mais feliz.
Os Prémios Nobel foram este ano menos do que seria de
esperar. Ficou por concretizar o meu plano inicial de comprar o “A Leste do
Paraíso” do Steinbeck, que foi livro do dia num dia em que não passei pela
Feira. “O Sol Nasce Sempre (Fiesta)” é a minha segunda oportunidade a
Hemingway, autor do qual não guardo boas recordações depois de ter lido “Por
Quem os Sinos Dobram”. Mas Steiner diz que o livro e o Hemingway são espectaculares e uma grande amiga também o diz, portanto vamos a mais esta tentativa. Outro
livro neste grupo foi uma surpresa, porque não sabia da sua existência: falo da
“Antologia Poética” de Juan Ramón Jiménez, que encontrei por acaso nas caixas
de promoções da Relógio D’Água com muito espanto porque pensava que o único livro seu editado em Portugal era “Platero e Eu”.
Clássicos
Como o adepto de clássicos que sou, esta é sempre uma
categoria com quantidades generosas. E clássicos são sinónimo de Relógio D’Água,
pelo que não é de espantar que dos nove livros neste grupo, cinco sejam dessa
editora, quatro dos quais comprados na banca de promoções a 5€. O único que foi
um pouco mais caro foi o terceiro volume de contos do Tchékhov, tendo cumprido a minha
tradição iniciada há dois anos de comprar um volume da colecção por Feira.
Não estava à espera de comprar o “O Bom Soldado Svejk” este
ano, embora já o quisesse há bastante tempo, porque nunca pensei que pudesse
estar a um preço convidativo. Isso foi até saber que era um dos livros na Hora
H selectiva da Tinta-da-China, passando dos 32€ habituais para 16€. Quase que
perdi os sentidos momentaneamente quando descobri tal coisa!
E para terminar este grupo, uma raridade com o carimbo Cavalo
de Ferro: “Anaconda” de Horacio Quiroga, impossível de encontrar actualmente
nas livrarias.
Literatura estrangeira contemporânea
Tenho várias tradições na Feira do Livro. Uma delas é
comprar algum livro nas promoções da Gradiva e da Nova Vega. E foi assim que “Um
Almoço Nunca é de Graça” de David Lodge e “A Costa das Sirtes” de Julien Gracq,
dois livros prestigiados embora as capas não o transpareçam, vieram parar à
minha estante.
Outra tradição é comprar um volume das obras completas do
Borges todos os anos, tradição de que me despedirei no próximo ano com a compra
do último volume. Vale totalmente a pena esperar, podendo assim comprar por 15€
livros que normalmente custam quase 37€.
Mas a grande compra da Feira do Livro de Lisboa de 2014 terá
de ser “Possessão” de A. S. Byatt, vencedor do Booker Prize em 1990, que estava
escondidinho numa das prateleiras junto ao chão na banca da Sextante, com uma
etiqueta amarela que valia em Hora H um desconto de 70%. Quando o vi pela
primeira vez havia dois exemplares. No dia em que fui à Hora H era o último.
Espero que alguém tenha sido tão feliz quanto eu a comprá-lo. Dos quase 30€ que
o livro custava paguei menos de 9€ e quase soltei uma lagriminha de
felicidade.
E ficou alguma coisa por comprar?
Claro que ficou! Já vos falei do “A Leste do Paraíso” do
Steinbeck, editado pela Livros do Brasil, mas há muitos mais. O “Gente
Independente” do Halldór Laxness na Cavalo de Ferro, a “Obra Poética Completa”
do Edgar Allan Poe na Tinta-da-China, o “Paraíso Perdido” do Milton e a “Ilíada”
do Homero na Cotovia, o “Canções da Inocência e de Experiência” do William
Blake na Antígona, o “São Paulo” do Teixeira de Pascoaes e o “O Medo” do Al
Berto na Assírio & Alvim e um sem fim de livros na Relógia D’Água: “Raparigas
de Escassos Recursos” da Muriel Spark, “Retrato de Uma Senhora” do Henry James,
“Decameron” de Boccaccio…
Enfim, para o ano há mais. Por agora fiquem com a minha
lista completa de livros comprados na Feira do Livro de Lisboa 2014,
salientando que a grande maioria custou até 7€, havendo apenas algumas
excepções que passaram os 10€:
“O Vampiro de Curitiba” de Dalton Trevisan, Relógio D’Água
“Uma Abelha na Chuva” de Carlos de Oliveira, Assírio &
Alvim
“O Vale da Paixão” de Lídia Jorge, Dom Quixote
“Causas da Decadência dos Povos Peninsulares” de Antero de
Quental, Tinta-da-China
“Contos” de Miguel Torga, Dom Quixote
“Embaixada a Calígula” de Agustina Bessa-Luís, Babel
“Odes Modernas” de Antero de Quental, Vega
“O Sol Nasce Sempre (Fiesta)” de Ernest Hemingway, Livros do
Brasil
“Morrem Mais de Mágoa” de Saul Bellow, Quetzal
“Antologia Poética” de Juan Ramón Jiménez, Relógio D’Água
“O Despertar” de Kate Chopin, Relógio D’Água
“Anaconda” de Horacio Quiroga, Cavalo de Ferro
“O Príncipe e o Pobre” de Mark Twain, Relógio D’Água
“O Bom Soldado Svejk” de Jaroslav Hašek
“O Homem que Era Quinta-Feira” de G. K. Chesterton, Relógio
D’Água
“Uma Mulher Perdida” de Willa Cather, Relógio D’Água
“Walden” de Henry David Thoreau, Antígona
“Contos de Tchékhov - Volume III” de Tchékhov, Relógio D’Água
“Os Cantos de Maldoror” de Conde de Lautreamont, Antígona
“O Deserto dos Tártaros” de Dino Buzzati, Cavalo de Ferro
“O Túnel” de Ernesto Sabato, Relógio D’Água
“As Mãos Pequenas” de Andrés Barba, Minotauro
“2666” de Roberto Bolaño, Quetzal
“Obras Completas: 1975-1985” de Jorge Luis Borges, Teorema
“Possessão” de A. S. Byatt, Sextante
“Gostamos Tanto da Glenda” de Julio Cortázar, Cavalo de
Ferro
“Os Ventos e Outros Contos” de Eudora Welty, Antígona
“Um Almoço Nunca É de Graça” de David Lodge, Gradiva
“A Costa das Sirtes” de Julian Gracq, Vega